Lírios brancos

PACHECO, Félix. Lírios brancos (Poemas do lar). Rio de Janeiro: Jacintho Ribeiro dos Santos Editor, 1919.
 
Dividido em três seções, Ignezita, Martha e As três, todas com temáticas voltadas para o ambiente familiar. Ignezita e Martha já haviam sido publicadas anteriormente, em 1915 e 1917, respectivamente.

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MARTHA
VII
 
Querem saber agora de teu peso,
E amarram-te numa alça de balança.
Eu nunca vi medir-se uma esperança.
Um crime assim então não é defeso?
 
Olho a parteira, atônito e surpreso,
E ela, tranquila e natural, me afiança:
– É para ver a robustez da criança…
E ei-la, treslendo no índice reteso!
 
E, ao vê-la suspendendo o leve fardo,
E convencida assim do que imagina,
O meu olhar fuzila como um dardo.
 
Tolice! Não se pesa a luz divina.
Para mim, que sou pai e que sou bardo,
Não tem peso nenhum esta menina.
 

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AS TRÊS
XXXI
 
Porque era assim meu peito: ermo e vazio,
Rude trecho cavado e órfão de encanto,
Onde só se escutavam ais e pranto,
E tudo era negror, mistério e frio.
 
Corajosa, uma vez, por desfastio,
Atravessaste o inferno com teu manto.
A Terra de Ninguém floriu de espanto,
E banha-lhe hoje o seio um manso rio!
 
Quanto poder no amor e quanta força!
O que não faz um leão faz uma corça…
Tu mudaste em jardins o chão medonho…
 
A guarda azul dos meus dois anjos lindos
Vela os tesouros mágicos infindos,
E a Terra de Ninguém agora é sonho!
 

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Félix Pacheco (Teresina, 1879 – Rio de Janeiro, 1935) foi um jornalista, político, poeta e tradutor brasileiro, membro da Academia Brasileira de Letras.